... da série animada Ren and Stimpy, ou nem deram por ela?
A RTP exibiu-a há uns 9 ou 10 anos, e desde então considero-a a animação mais desvairada, humorosa, inteligente e provocatória que chegou às TVs em anos recentes. As histórias e caricaturas absolutamente despreocupadas sobre se ofendiam alguém, eram engraçadas pelo simples gozo de rir, muito e alardemente. A imagética declaradamente retro-kitch, glam-decandente, muito inspirada na cultura hollywoodesca do período da guerra-fria, foi uma lição de estilo e história de arte no meu 10º ano, que nunca mais poderia esquecer. Enfim... Foi criada em 1991 por John Kricfalusi que em 1997 desenhou um teledisco para a cantora Bjork, aquando do álbum que sucedeu o de debutante a solo. Foi para a canção “I Miss you”... Com franqueza, as imagens e a música combinam na perfeição!
“ALL IS FULL OF LOVE” – Bjork, “Homogenic”,1999 Este video, da autoria de Chris Cunningham foi premiado incontáveis vezes, incluindo com o prémio de Melhor Video Musical de Fantasia no Fantasporto.
Depois de ouvida a faixa sonora, o realizador sintetizou as impressões que lhe haviam sido transmitidas pela cantora: ‘sexual’, ‘leite’, ‘estátuas chinesas, de porcelana branca, dura e gélida, que se diluem no amor erótico’, ‘cirurgia’, ‘luminosidade celestial’... Das fantasias tecnológicas do realizador já faziam parte as ideias de robótica e maquinaria industrial, a imagem da andróide produzida pela imaginação visionária de Fritz Lang em "Metrópolis", que explora a anatomia feminina expondo-a despida, logo erótica, e havia a vontade de dar ao video um visual antiquado, datado dos anos 70, sintéticos, estilizados e reluzentes em plásticos.
Durante toda a produção do video o resultado permanceu incógnito: havia muita incerteza sobre uma linha conceptual que não fora esclarecida desde o princípio, e estava emaranhada em referências extremamente díspares. Quando a produção chegou ao tratamento gráfico computorizado, uma identidade começou a distinguir-se e tornou-se mais fácil dirigir então o video para um resultado concreto. O resultado está à vista, e dispensa muitas palavras. No filme “I, Robot” a inspiração tem uma origem indubitável.
Duas androides identificadas como Bjork, assistem-se uma à outra no processo de criação, e animação. É clara a alusão à concepção intra-uterina já que as figuras são femininas, mas também à mecânica industrial, e à dependência de servo-mecanismos como interfaces da criação. As criaturas, que vemos trocarem palavras e actos de amor, subitamente convidam-se ao enlace erótico, impossível entre fetos ou entre maquinaria. Nesse instante somos desarmados pela supresa de verificar que existe penetração, que existe produção e troca de fluidos, que poderia existir fecundação, que existe consciência do momento, do amor, do sexo... existe deleite emocional e deleite físico. O video aparentemente é acidentalmente lésbico, e inesperadamente emocional e quente... como não suporíamos serem os androides em ambiente acéptico. Mas duvidar de quê? Tudo está cheio de amor.